Os Coguis são uma tribo ameríndia residente no norte de Serra Nevada na Colômbia. São cerca de 10 mil pessoas. Falam a sua língua, têm costumes e ideias próprias. As suas práticas baseiam-se na crença de que a Terra é um ser vivo e de que a Humanidade tem dois irmãos: os irmãos maiores (eles próprios) e os irmãos menores (nós, os comuns mortais). Os segundos, são descritos como “crianças asneirentas” que precisam aprender a viver Humanidade.
Com o sem base cientifica, esta era a razão que me levava sonhar em chegar a Serra Nevada para entrevistar crianças coguis e pedir as suas dicas para melhorarmos a interação com a Terra. Apenas não planeei que Minca e Macondo, mudassem não só os meus planos, como o tema da crónica de hoje.
Na última crónica falei da importância da ligação com a natureza para a saúde emocional da família. Hoje foco-me na liberdade.
Na verdade, a liberdade começou a ganhar corpo antes de chegar a Minca. Quando “tropeçei” com Macondo.
Macondo é uma vila com cerca de 300 pessoas na cidade da Aracataca, onde Gabriel Garcia Marquez viveu a sua infância e usou como cenário para o romance “Cem anos de Solidão”.
Este romance é marcado pelo isolamento e destruição da vila e, são as gerações da família Buendia que se vêm obrigadas a assumir um papel ativo no desenvolvimento próspero da região e da sua libertação pessoal. Coincidentemente (ou não) a esta altura já desconfiava que liberdade e solidão podiam caminhar juntas, mas foi em Minca que me apercebi da profundidade da coisa.
Minca é um lugar de almas livres. Senti-o imediatamente quando cheguei. Talvez o violoncelo de Pablo tenha ajudado, mas a localizaçõa a 600 metros de altitude, as casas rústicas em ruínhas apertadas e as cerca de 300 espécies de pássaros que sobrevoam a vista para Santa Marta, decerto contribuíram.
Pablo mostrou-me que a liberdade, começa com o “dedo” da família e pode caminhar junto com a solidão quando não é bem “cozinhada”. Ser livre depende não só do óbvio, externamente (prisão…), mas acima de tudo, de processo internos (Medos, pressões sociais..etc) daí que a expontaneidade seja uma das principais mediadoras entre o que está dentro e o que sai para fora.
Deu a entender que ter medo de falhar faz parte do processo, mas não é o fim do mesmo.
E foi nesta refelxão que ele que me levou a conhecer Sónia e o seu projeto.
Sónia é a criadora de uma comunidade. Decidiu cria-la anos antes, por acreditar que para ser livre é essencial viver saber viver com os outros, só assim se treina a expontaneirdade poder gerir o próprio tempo: “antes de ter esta comunidade tinha um negócio de motas que me obrigada a ter muita disciplina de tempo. Tinha sempre a sensação que estava “presa” ao negócio. E como prestava um serviço ao público, raramente podia ser expontanea e criativa. Ganhava cada vez mais dinheiro, mas não tinha tempo para estar com quem mais gostava, não tinha tempo para lazer e já quase não sabia quem era. Sentia-me presa. Por isso criei uma comunidade onde pudesse ser mais eu, ser mais genuina, expontanea e acima de tudo, conseguir gerir o meu tempo. Já que para mim, isso me ajuda a sentir livre”.
Sónia tem com ela 15 nacionalidades diferentes, mais de 15 pessoas: entre músicos, artistas e amantes de natureza, cada um assume um papel no grupo, gere o seu tempo e o contributo que quer dar.
Hoje aquela comunidade é conhecida por promover as melhores Jam sessions, culturas de café e ainda exposições de arte, da região.
Minca e Macondo, Pablo e Sónia deram um contributo importante sobre a liberdade, mas foram as respostas das crianças, nos vários cantos do mundo, que me mostraram a sua profundidade:
A Pergunta feita foi: “O que mais odeias que os adultos façam?”
As respostas:
Na Colômbia: “Quando me dizem que tenho que ir fazer coisas que não gosto e não entendo porquê.” Emília, 7 anos.
No Brasil: “Quando eu falo e ninguém me ouve!!” Bruno, 6 anos.
Em Portugal: “Quando me obrigam a comer coisas que não gosto …que odeio!” Rafael, 7 anos
Em São Tomé e Príncipe: “Quando violam pessoas.” Daisy, 9 anos.
Na Serra Leoa: “Quando me obrigam a fazer coisas e não ouvem que estou a fazer as minhas coisas” Bill, 8 anos.
O contributo dos mais novos, veio mostrar que a liberdade tem papel diferente nas várias fases de desenvolvimento humano, e que “ a sensação de perder o controlo da própria Vida” é um foco de mal estar transversal a várias idades.
De facto, se olharmos para a filosofia, Espinoza defende que ser livre é agir de acordo com a própria essência, com a sua natureza. Outras prespetivas focam na autonomia e a espontaneidade do sujeito. Nelson Mandela acrescenta a dimensão dos “outros”.
Segundo o relatório de felicidade de 2012, uma das componentes mais importantes no sentido de bem-estar e realização pessoal do Ser Humano é a sensação de liberdade. O índice de liberdade humana deste relatório, mostra que a sensação de liberdade dos vários povos, está divida em três áreas: “liberdade de expressão, de escolha, de gestão de relações”, mas o tempo tem um papel transversal a todos eles.
Ao nível das crianças a liberdade é reforçada pela espontaneidade, pela autoestima e capacidade de lidar com o fracasso. E neste caso, sendo que a família é a primeira instituição social que a crianças conhece, é importante que estas competências sejam estimuladas aqui. Ao nível do adulto e gestão de dinâmicas familiares, sem dúvida que o tempo é uma questão de desarmonia.
Desarmonia porque, se uns são mais rápidos que outros, outros não podem esperar; uns porque têm mais tempo que outros para “as suas coisas” e ainda há aqueles que não sentem ter tempo para nada, e isso é injutso.
Resumindo, ao nível de Liberdade na família, abordo duas dimensões: gestão de tempo nos adultos e o desenvolvimento de espontaneidade nas crianças.
Os estudos indicam que as mães sentem mais responsabilidade na educação dos filhos e, são elas que sentem deixar de ter tempo para si e para as suas coisas. Os estudos tambem mostram que o Fosso de Felicidade Parental (satisfação com a parentalidade) se altera com a fase de vida da dinâmica familiar e da criança. Uma família com pouco apoio externo ficará mais afetada com a doença de um pequeno, do que outra com apoio de avós, por exemplo.
Para reduzir este fosso, vários países criam respostas. Na Dinamarca, por exemplo, uma das respostas foi o programa de “empréstimo de avós” onde os mais velhos se inscrevem para adotar uma família e apoiar nas questões logísticas da mesma. Afinal se um casal consegue fazer um bom trabalho, imaginem 4 casais. No Japão adotaram o shirin-yoku, “um banho de floresta”. A proposta Japonesa é que de tempos a tempos, as famílias se percam na natureza e usem os seus sentidos, segundo eles, a experiência vai reforçar laços e sentimento de pertença, capacidade de arriscar e arrojar. Em Bogotá, na Colômbia, a medida adotada foi o “fecho das ruas aos domingos” para que todos possam aproveitar o tempo livre em família usando a ciclo via.
Segundo Meik Viking, os Portugueses têm muita satisfação com parentalidade. Em Portugal há um equilíbrio entre o tempo de trabalho, de lazer e os custos de serviços de apoio às crianças.
Por isto deixo algumas dicas para os adultos libertarem tempo, facto que lhes trará mais sentido de liberdade na rotina diária e em seguida algumas dicas para formar futuros adultos mais espontâneos, com menos medo da solidão, com mais capacidade para exporem as suas opiniões e sentirem-se mais e melhor na sua pele, mais livres.
Para Pais:
1. Ter uma prática física que inclui socialização. Fará 2 em um. Pode estar com um amigo/amiga e incluir na sua vida exercício físico.
2. Aproveitar mais os tempos mortos. Dois minutos aqui, 5 ali, podem ser usados para fazer pequenas coisas. Aproveito sempre para fazer algumas pesquisas. Mas o Meik Wiking usa-o com uma aplicação para aprender Espanhol.
3. Se se deslocar de transportes públicos, aproveite para ler um livro
4. Cozinhe mais do que precisa. Ter mais comida feita, permite que mantenha uma alimentação saudável e que tenha finais de dias livres.
5. Focar-se e evitar o que Meik Wiking chama de “sangue sugas de tempo”, como as redes sociais ou os jogos de telemóvel. Evitando-os, dedicará mais tempo a comunicar em família, melhorar as interações com todos e consequentemente o sentido de pertença.
Para incluir na educação dos miúdos e promover o seu sentido de liberdade:
1. Incluir a prática de atos de bondade: Um ritual de visita a uma instituição e progressivamente adicionar ações como ajudar quem precisa, dar um elogio a alguém, conversar com uma pessoa tímida ou isolada.
2. Promover a empatia: “o que será que a pessoa X ou Y está a sentir agora?” pode ser feito em tom de jogo.
3. Cumprimentar as pessoas com quem nos cruzamos todos os dias.
4. Sorrir para estranhos
5. Promover a confiança na criança. Sim, sei que nem sempre é fácil, tendemos a pensar que sabemos o que é melhor para os mais pequenos, por isso ouça com paciência, mostre curiosidade e transmita encorajamento para que ele/ela consiga fazer coisas por si e desenvolva o seu sentido de “ser único” sem pressões sociais.
6. Mostrar apoio incondicional perante as escolhas da criança. Uma das maiores questões da liberdade, que a pode levar à sensação de solidão e de que não se tem o apoio e compreensão dos progenitores.